Como biólogo, sempre tive preocupação com o meio ambiente; na verdade, desde criança eu já manifestava um certo apreço por plantas e animais. Minha mãe, por exemplo, tinha pavor de lagartixas; se pudesse, mataria todas! Um dia a vi tentando matar uma com inseticida em spray – descarregou o vidro inteiro na coitada, que saiu cambaleante, mas não morreu. Pudera… essa bichinha é resistente! Mas me deu tanto dó que briguei com minha mãe imediatamente! Como eu tinha cinco ou seis anos apenas, ela não me deu bronca pela petulância, mas percebeu que eu tinha um carinho pelos bichos que ela não poderia ignorar. Nunca mais tentou matar nenhuma lagartixa, mas chamava meu pai ou meu irmão mais velho para tirá-la de lá.

Até então, minha diversão era cuidar dos passarinhos que ficavam no nosso pomar e brincar com os minúsculos tatus-bolinha que apareciam na grama, mas aí cresci mais um pouco e pedi um cachorro, garantindo que eu cuidaria dele sozinho (e cuidaria mesmo!). Fomo s a um canil e escolhi dois vira-latas de pequeno porte; claro que meus pais não permitiriam que eu tivesse dois, e mandaram que eu escolhesse apenas um; fui direto num dog alemão gigantesco, já de idade e que tinha quatro vezes a minha altura. Meus pais acharam melhor a gente levar os dois pequenos, mesmo. No ano seguinte, meu pai foi transferido de banco e fomos morar na praia de Maresias.

Salto no tempo

Sem mais delongas, o negócio é o seguinte: cresci, fiz faculdade de Biologia e me especializei em Biologia Marinha, numa faculdade do Rio de Janeiro. Voltei para Maresias onde entrei num projeto de conservação da vida marinha da região. Quem ouve isso pensa que trabalhamos em alto mar o dia inteiro, naquele cenário paradisíaco, mas não imagina como é complicado. Muitas vezes, saímos com o mar revolto, em tempo chuvoso e com muitos raios. Às vezes fica tão perigoso que nem saímos. Além do mais, a maior parte do nosso trabalho é documental ou de laboratório em terra firme. É… não é tão romântico assim…

Eu estava perto de completar meu segundo ano no projeto quando houve um acidente. Um caminhão carregado de diesel refinado tombou na estrada (parece que ele derrapou numa curva que estava suja de óleo de outro caminhão que tinha tombado um pouco antes) e esse óleo atingiu a praia de Maresias. Cerca de 800 metros da praia ficaram interditados por vários dias porque, como o óleo era refinado, era muito difícil contê-lo com boias. A sorte é que era setembro, mês em que o inverno já não está tão rigoroso, mas também não está tão quente assim, e o número de turistas ainda é baixo. Mas alguns mais afoitos forçaram a barra e entraram no mar na área proibida e acabaram saindo com várias irritações nos olhos, na pele e no esôfago (alguns se engasgaram com a água contaminada e engoliram um pouco do óleo junto dom a água, uma confusão).

Contenção e danos

Foram dias muito tristes. Muitos peixes e animais nativos da região como aves aquáticas apareceram mortos, ou agonizando e cobertos de óleo. Na areia, manchas do produto formavam longas faixas, e o cheiro de diesel se espalhava com o vento por toda a praia de Maresias – e até um pouco além. Nesses dias, nem dava pra sair com meus cachorros pois o ar estava irrespirável até para nós, imagine para eles, que têm o faro mais sensível!

Obviamente, surgiu o cabo de guerra entre a transportadora do óleo, a refinaria e os órgãos de proteção trocando farpas, acusações e cobranças. Enquanto isso, alguns órgãos de defesa e saneamento faziam o possível para tentar remover o óleo da água e salvar o máximo da fauna local.

Foram muitos dias de trabalho intenso, mas só ao final de um mês a recuperação ambiental parecia estar completa. Não achamos mais traços de óleo na água, não apareciam mais animais mortos e a areia estava quase totalmente limpa de novo. Agora dava pra passear com os meninos de novo!

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